Terceiro Trimestre


Sinto a cabeça do bebê pesar lá embaixo,
já incomoda levantar rápido,
já estou produzindo colostro e ficar
com os seios cheios e de sutiã firme
é algo surreal para quem precisa de
muita liberdade física nesses preparativos
finais. Essa parte tá idêntica ao meu
terceiro trimestre gestando Helena.
A única mudança radical é o meu 
estado mental. Eu já estava mais do que
ansiosa quando atingi o sétimo mês com
Helena, e tudo, absolutamente tudo me
dava uma sensação de muito medo do
abismo. Quem já desceu o labirinto do 
parto uma vez, sabe muito bem e mais
do que ninguém que cada parto é um 
parto e que não temos como controlar
absolutamente NADA. Podemos sim
jogar cartas da manga na mesa, como
acupuntura para virar o neném e para
lembrar o corpo do trabalho de parto,
podemos nos tocar e massagear com
óleos variados a barriga conversando
com o neném, tentando entrar num 
acordo com ele, pedindo para ele se
fundir com sua natureza e encaixar na
melhor posição, eu li em vários lugares
isso e fiz muito com Helena e ela se 
encaixou perfeitamente em tempo certo,
mas era vontade dela nascer daquele jeito.
Era nossa biografia sendo construída e à 
gente só nos coube viver. Mistérios de 
agora tèm todos a ver com psicologia e 
emoções. Eu estou completamente grudada
e fusionada com Helena talvez de uma forma
nunca vivida, numa intensidade máxima. 
Acho que isso foi um processo dela e meu
de "ninguém vai nos afastar", nossos corpos
querem ficar juntos e abraçados e se adulando.
Ela está grande e pesada, mas sinto uma paz
incomparável quando abraço minha filha nesse
final sempre inseguro da gravidez. Não queria
ficar longe dela. Não queria ter que trabalhar.
Ou talvez até quisesse, caso ela pudesse vir 
comigo para a sala de aula. Temo que esse meu
sentimento seja nocivo para ela, mas ao mesmo
tempo, ele está totalmente harmonizado com o
sentimento dela. Fico pensando no que o bebê
que está na barriga sente sobre isso, mas quando
paro de pensar e sinto ele, me parece que ele 
acha tudo isso muito natural, e quando ele sair
vai ser só mais um pendurado. E daí me bate 
uma certeza arrogante de que onde cabem eles
dois, também caberia um terceiro, um quarto...
Mas não tenho como vivenciar esse número
de gestações por muitos motivos: necessidade de
me cuidar, dinheiro para me recuperar de duas
gestações, uma praticamente atrás da outra,
necessidade de me dedicar ao mercado de
trabalho e às atualizações que são impostas a
qualquer funcionário minimamente bom hoje
em dia, vontade de voltar a estudar (achei que eu
ia dar mais tempo pra mim mesma depois do mestrado,
mas acho que já chega, o tempo foi suficiente),
vontade de sair um pouco também dessa escadinha
de montanha-russa hormonal pré e pós-parto,
seguida de 2 anos de amamentação e fraldinha,
é gostoso, mas esgota qualquer humana.
Vontade de viver uma nova fase no casamento,
a gente chegou a vivenciar uns meses muito
libertários de passeios, restaurantes, tempo livre
pra nós dois e muito namoro quando Helena
decidiu ser bem mais independente e querer
ficar com outras pessoas e dizer isso na nossa cara.
Foi tudo muito delicioso e to com muita saudade
de viver agarradinha com meu amor, passear sem
obrigação de ter milhares de preocupações na cuca.
O número de rituais também diminuiu muito
nessa gravidez, antes eu tinha o tempo só pra
cuidar de mim, então suco verde, solzinho da
manhã, pratos de espinafre e couve no bafo,
momentos de silêncio, yoga, não existiram tanto
nessa gravidez, minhas prioridades eram todas
relacionadas à rotina da Helena e à limpeza e 
arrumação da casa para proporcionar a ela uma
tranquilidade de ambiente e cotidiano muito grandes.
Realmente malhei no segundo trimestre, suei 
bastante na academia e em casa e isso me fez
sentir a gravidez de uma forma diferente: gravidez
é força, poder e energia, basta direcionar pra onde
o corpo pede. Meu corpo tá implorando energia 
nesse momento. Saindo de uma virose + laringite
que durou as últimas 3 semanas graças à proibição
de todos os médicos de medicação forte para as
gestantes. Eles estão certíssimos, eu é que to 
chorona, pedindo penico. Ontem me deu um treco
e eu saí plantando flores em casa, plantei mais 60
mudas de flores... acho que eu precisava espairecer.
Vamos ao tempo que resta e essa cara de cansada 
vai piorar muito ainda até o final do trimestre.

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